M/DSLC - Solução ou fonte de problemas?

João J.M. Gonçalves
18 de novembro de 2024


Introdução

"Tudo o que é acrescentado sem serventia acaba assumindo a função de causar problemas."


  O DSLC (Digital Synchronizer and Load Control) da Woodward, lançado em 1986, representou um marco significativo no controle e sincronização de grupos geradores, principalmente em sistemas que demandavam precisão, confiabilidade e eficiência. Esse período foi marcado por um avanço na digitalização dos sistemas de controle, refletindo uma transição tecnológica que visava substituir sistemas analógicos tradicionais, que eram mais limitados em termos de flexibilidade e precisão.

Contexto Histórico

  Durante os anos 1980, a indústria de geração de energia estava em plena transformação. A busca por maior eficiência, automatização dos processos e controles mais precisos tornava-se uma prioridade global, especialmente diante de um mercado que exigia sistemas mais confiáveis para geradores de energia. As aplicações de geração distribuída e sistemas que operavam em paralelo com outras fontes de energia passaram a demandar soluções com capacidade para gerenciamento de carga, controle de sincronismo e monitoramento de parâmetros elétricos em tempo real.

Características dos Controladores M/DSLC

  O M/DSLC foi projetado para controlar sistemas de geradores a diesel, gás e outras máquinas primárias, como turbinas a vapor, com precisão na sincronização e no controle de carga. Ele permitia a sincronização automática com outras fontes e distribuía de forma eficiente a carga elétrica entre os grupos geradores conectados em paralelo. A introdução dessa solução digital também simplificava o gerenciamento de sistemas complexos e oferecia maior capacidade de comunicação e integração com outras soluções.



MSLC e DSLC eliminados na Usina Santo Antonio em Sertãozinho/SP.

Impacto e Evolução TOPO

  A popularidade do DSLC e de sua versão subsequente, o DSLC II, deveu-se ao aumento da demanda por controle de geração elétrica em plantas industriais, operações de backup de energia e sistemas de geração de energia para serviços essenciais. O lançamento em 1986 foi um reflexo da busca da Woodward por soluções que melhorassem a eficiência e a confiabilidade dos sistemas elétricos. Sua tecnologia abriu caminho para outros avanços em controle de geração e monitoramento, consolidando-se como uma referência no mercado de controle de geradores.


DSLC II eliminado na RICAL em Ji-Paraná/RO.

Reguladores para Turbinas a Vapor

  Até os anos 1990, muitas turbinas a vapor ainda utilizavam reguladores hidráulicos para controlar a velocidade e a carga. Esses sistemas tradicionais, embora robustos, eram mecanicamente complexos e menos flexíveis, o que limitava a capacidade de adaptação a novas demandas industriais. Na indústria, turbinas a vapor de pequeno porte desempenhavam um papel crítico em processos de geração de energia, mas careciam de sistemas de controle eletrônicos que fossem econômicos e eficientes.
  A Woodward, buscando atender a essas necessidades, oferecia o 2301A, um regulador analógico que, apesar de popular, era relativamente primitivo. Ele fornecia funções básicas de controle de velocidade e carga, mas não possuía a flexibilidade e a precisão necessárias para aplicações mais exigentes ou para operação em sistemas mais complexos. Sua simplicidade, no entanto, era uma vantagem em termos de custo e facilidade de manutenção, o que o tornava uma escolha viável para muitas turbinas pequenas.
  Com a introdução do DSLC (e do MSLC), a Woodward trouxe ao mercado uma solução digital que complementava as funções do 2301A e de reguladores de tensão que, em muitos casos, eram simples demais para atender às novas exigências da indústria. O DSLC oferecia controle digital de sincronização e carga, permitindo o gerenciamento preciso de grupos geradores, mesmo em sistemas complexos, como plantas que usavam turbinas a vapor em conjunto com outras máquinas. Isso preenchia uma lacuna significativa na necessidade por soluções de controle mais avançadas e integradas, oferecendo mais precisão, flexibilidade e eficiência do que os reguladores analógicos tradicionais.

Turbina ABB com regulador de velocidade hidráulico do tipo KALB em Gauíba/RS.

Regulador Dedini.

Consolidação dos Controladores M/DSLC
como Equipamentos Essenciais no Setor Sucroalcooleiro TOPO

  Durante os anos em que os reguladores de velocidade e tensão evoluíam e se tornavam mais sofisticados, a Woodward foi consolidando a reputação do MSLC (Master Synchronizer and Load Control) e do DSLC (Digital Synchronizer and Load Control) como equipamentos essenciais para o controle de grupos geradores e sistemas de geração de energia distribuída. Essa importância se destacou especialmente no setor sucroalcooleiro do Brasil, um dos principais segmentos da indústria nacional.
  O setor sucroalcooleiro opera com uma combinação de turbinas e geradores em usinas de açúcar e etanol, onde a geração de energia precisa ser eficiente, confiável e bem coordenada para atender à alta demanda de consumo e, em muitos casos, exportar excedentes para a rede elétrica. Os controladores DSLC e MSLC ofereciam soluções digitais avançadas, como sincronização automática, controle de carga precisa e gerenciamento integrado de múltiplos geradores, recursos que potencializavam a eficiência das usinas e aumentavam a segurança operacional.
  Essa combinação de controle preciso e flexibilidade não apenas melhorava o desempenho dos sistemas de geração de energia das usinas, mas também se alinhava com os objetivos do setor de reduzir custos operacionais e aumentar a produtividade. À medida que os reguladores de velocidade e tensão se tornavam mais sofisticados, os MSLC e DSLC se firmavam como ferramentas indispensáveis para garantir a sincronização e a estabilidade dos sistemas de energia nas usinas. Dessa forma, a Woodward não apenas conquistou relevância tecnológica, mas se tornou uma referência de confiança para soluções integradas de controle e automação no setor energético brasileiro.


Desafios e Limitações do Uso dos Controladores M/DSLC com Turbinas a Vapor TOPO

  Embora os controladores MSLC (Master Synchronizer and Load Control) e DSLC (Digital Synchronizer and Load Control) tenham se destacado como soluções eficazes em muitos sistemas de geração de energia, especialmente em motores diesel, a aplicação em turbinas a vapor revelou uma série de desafios e limitações. Isso ocorre porque esses controladores foram desenvolvidos para ter desempenho ótimo com motores diesel, que apresentam características operacionais distintas das turbinas a vapor.
  No caso das turbinas a vapor, mesmo que os M/DSLC ajudassem a complementar as deficiências dos reguladores de velocidade e tensão mais simples, a performance de controle estava longe de ser ideal. Um dos principais obstáculos é que o MSLC, o DSLC e os reguladores de velocidade e tensão formam uma cascata de controladores que torna a malha de controle complexa e difícil de sintonizar. Devido à maior inércia e características específicas de resposta das turbinas a vapor, ajustá-los para proporcionar um controle otimizado e estável se torna uma tarefa árdua.
  Essa complexidade frequentemente resulta em controladores que ficam com ajustes subótimos, levando a problemas graves de oscilação de potência. As oscilações podem comprometer a estabilidade do sistema, diminuir a eficiência operacional e causar desgaste mecânico adicional na turbina. Esse tipo de problema impacta diretamente a performance e a confiabilidade do controle de carga e sincronização das turbinas.
  O sincronizador automático também enfrenta desafios ao ser utilizado em sistemas de turbinas a vapor. Em muitos casos, ele pode demorar excessivamente para concluir a manobra de paralelismo com outros geradores ou com a rede elétrica, especialmente em aplicações envolvendo o MSLC. O tempo excessivo necessário para sincronização pode prejudicar o desempenho e a segurança do sistema, tornando o processo de paralelismo menos ágil e menos eficiente em comparação com aplicações baseadas em motores diesel, para as quais esses controladores foram originalmente projetados.


Oscilações de potência ativa causadas pelo DSLC (curva azul).


A Evolução dos Reguladores de Velocidade e Tensão e a Supremacia dos Controles Modernos TOPO

  Ao longo dos anos, os reguladores de velocidade e tensão passaram por um processo contínuo de evolução tecnológica, tornando-se muito mais sofisticados e autônomos em suas funções de controle. Esse avanço impactou diretamente a necessidade de sistemas complementares como os MSLC (Master Synchronizer and Load Control) e DSLC (Digital Synchronizer and Load Control), especialmente em aplicações que exigem maior flexibilidade e desempenho.
  No que diz respeito aos reguladores de velocidade, a Woodward trouxe inovações significativas com dispositivos como o 2301E-ST e o 505. Esses controladores foram projetados com uma sofisticação muito maior em comparação com seus antecessores e se destacam pela capacidade de realizar controle preciso da potência ativa de sistemas de geração. Entretanto, ao contrário do DSLC, esses reguladores não desempenham funções de sincronização automática ou controle de potência reativa, tarefas que são tradicionalmente atribuídas aos reguladores de tensão.
  Reguladores de tensão modernos oferecem capacidades adicionais que incluem funções de sincronização automática e controle de potência reativa ou fator de potência, dispensando a necessidade de dispositivos complementares como o DSLC para tais funções. Com isso, as operações de sincronização e controle de potência elétrica tornaram-se mais diretas e eficazes, melhorando a eficiência e precisão do sistema como um todo.
  No caso de aplicações em turbinas a vapor, a introdução dos 2301E-ST e 505 como reguladores de velocidade otimizados traz vantagens significativas. O uso desses controladores elimina a necessidade de uma cascata de controladores típica de sistemas baseados no MSLC e DSLC, o que simplifica o sistema de controle, reduz atrasos e melhora a estabilidade geral. A combinação de reguladores modernos de velocidade e tensão permite um controle mais rápido, eficiente e estável, resultando em performance superior quando comparada aos sistemas que ainda dependem de múltiplos controladores intermediários.


Regulador ABB Unitrol 1010 e o IED SEL 700G: ambos acumulam a função de sincronizador automático.

O moderníssimo Woodward 505. Combinado com o Unitrol e o 700G em um projeto eficiente, controladores complementares como o DSLC se tornam dispensáveis.

Conclusão TOPO

  Embora o DSLC (Digital Synchronizer and Load Control) tenha desempenhado um papel crucial nos anos 90 e na primeira década do século XXI, sua relevância foi gradualmente superada pela evolução dos reguladores de velocidade e tensão. Com o passar do tempo, esses reguladores se tornaram mais sofisticados e autônomos, sendo capazes de realizar as funções de controle de potência ativa, sincronização automática e controle de potência reativa ou fator de potência de forma mais eficaz e integrada. Esse avanço eliminou a necessidade de dispositivos complementares como o DSLC, tornando-o, na prática, uma solução obsoleta e desnecessária.
  Apesar disso, ainda persiste em alguns setores a crença de que o DSLC é uma solução indispensável para sistemas de geração de energia, especialmente em contextos mais tradicionais. Na realidade, sua aplicação hoje representa um vício de engenharia, ancorado em práticas do passado e que desconsidera os avanços significativos alcançados pelos reguladores modernos. Substituir o DSLC por controladores mais avançados não apenas simplifica a malha de controle, mas também melhora o desempenho geral do sistema, reduzindo complexidade, custos e os riscos de oscilação e de controle impreciso.


Mais um DSLC exterminado.